“A vida não tem equilíbrio, mas equilibristas.” A frase de José Miguel Wisnik nos lembra que a estabilidade não é um estado fixo, mas um movimento constante. No trabalho, essa dinâmica se torna ainda mais evidente. O que garante que não sejamos tragados pelo excesso de demandas, pela pressão ou pelo esgotamento não é a ausência de desafios, mas a forma como lidamos com eles. As empresas, como parte essencial desse jogo de forças, precisam reconhecer que a saúde mental não é um detalhe ou um privilégio, mas uma necessidade estrutural. Não se trata apenas de um diferencial competitivo ou de um discurso moderno, mas de uma exigência concreta. A NR 1, que estabelece diretrizes para o Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO), reforça essa responsabilidade, determinando que as organizações avaliem e mitiguem os riscos psicossociais que podem comprometer a saúde dos trabalhadores. Com a obrigatoriedade do Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), todas as empresas terão que estar em conformidade até maio de 2025, garantindo um ambiente de trabalho mais seguro e saudável.
Os riscos psicossociais e seus impactos
Riscos psicossociais são condições do ambiente de trabalho que podem afetar negativamente a saúde mental dos funcionários. Entre os principais fatores, destacam-se o excesso de carga de trabalho, a pressão por resultados inatingíveis, a falta de reconhecimento e o suporte emocional insuficiente. Ambientes tóxicos, onde há assédio moral ou discriminação, jornadas desorganizadas e a dificuldade em equilibrar vida pessoal e profissional também contribuem para o adoecimento psicológico.
Esses fatores não são apenas um problema individual; eles se refletem na organização como um todo. O impacto vai além do sofrimento dos trabalhadores e se traduz em aumento do absenteísmo, queda na produtividade, alta rotatividade e, muitas vezes, em um ambiente corporativo deteriorado. Empresas que negligenciam esses riscos acabam enfrentando não apenas dificuldades na retenção de talentos, mas também prejuízos financeiros e de imagem.
Como as empresas devem se adequar?
A NR 1 exige que as empresas realizem o mapeamento dos riscos ocupacionais, incluindo os psicossociais, e implementem estratégias de prevenção e mitigação. Para isso, é essencial que as organizações desenvolvam um diagnóstico preciso da realidade do trabalho. Pesquisas de clima organizacional e entrevistas são ferramentas importantes para identificar fatores que geram estresse, ansiedade e esgotamento. Apenas conhecendo o problema em profundidade é possível estruturar soluções eficazes.
Prevenir o adoecimento mental no trabalho exige um esforço contínuo e estruturado. Criar programas de saúde mental no trabalho que vão além de palestras pontuais e implementar políticas de apoio psicológico são passos fundamentais. O suporte pode vir de canais internos, como um setor de saúde ocupacional preparado para lidar com essas questões, ou por meio de parcerias com profissionais especializados.
Os gestores desempenham um papel central nesse processo. Eles precisam estar preparados para reconhecer sinais de sofrimento psíquico e atuar preventivamente. A capacitação das lideranças deve ir além da simples execução de metas; é necessário desenvolver uma gestão baseada no diálogo, na empatia e na transparência. Um líder bem treinado pode ser um fator de proteção contra o burnout e outras formas de adoecimento mental.
A organização do trabalho também deve ser repensada para garantir que haja equilíbrio entre produtividade e bem-estar. Definir limites claros para jornadas de trabalho, estruturar pausas regulares e criar uma cultura que respeite os momentos de descanso são práticas que, além de protegerem os trabalhadores, aumentam a eficiência das equipes. O mito de que produtividade está ligada a jornadas exaustivas já se mostrou ultrapassado; um ambiente saudável gera resultados melhores e mais sustentáveis.
A comunicação dentro da empresa precisa ser um canal aberto e seguro. Os trabalhadores devem sentir que podem relatar situações de estresse, conflito ou sobrecarga sem medo de retaliações. Construir uma cultura organizacional baseada no respeito e no cuidado não significa abrir mão da eficiência ou dos resultados, mas sim criar um ambiente onde o trabalho possa ser uma experiência de realização, e não uma fonte de sofrimento.
O papel estratégico da saúde mental no trabalho
Empresas que investem na gestão dos riscos psicossociais não estão apenas cumprindo obrigações legais, mas construindo uma estrutura mais sólida para o futuro. Uma organização que cuida da saúde mental dos seus trabalhadores fortalece sua identidade, melhora a retenção de talentos e obtém equipes mais engajadas e produtivas.
O trabalho, quando bem estruturado, pode ser um espaço de crescimento e construção de sentido, e não de adoecimento. Criar ambientes saudáveis é um desafio coletivo, que exige comprometimento, planejamento e mudança de mentalidade. Mais do que uma questão de cumprimento de normas, a saúde mental nas empresas deve ser vista como uma escolha estratégica e, acima de tudo, ética. Afinal, nenhuma organização prospera verdadeiramente quando seus trabalhadores adoecem.
Autora: Marina Silveira