Com a atualização da NR-1, que introduz o Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO) e o Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), tornou-se obrigatório considerar não apenas os riscos físicos, químicos e biológicos, mas também os riscos psicossociais. Essa inclusão tem gerado dúvidas e, em alguns casos, resistências por parte das empresas, como se o foco na saúde mental significasse um enfrentamento entre fiscalização e gestão. No entanto, é fundamental compreender que a NR-1 não está contra as empresas. Pelo contrário: ela oferece instrumentos de avaliação e gestão para lidar com questões que já estão presentes no cotidiano organizacional.
Os riscos psicossociais não são uma invenção da norma. Eles já existem, mesmo quando não são nomeados: jornadas exaustivas, metas inalcançáveis, assédio moral, insegurança no trabalho, isolamento, conflitos interpessoais, sobrecarga emocional e falta de reconhecimento são apenas alguns exemplos. O que a NR-1 propõe é que esses elementos sejam olhados com seriedade e metodicamente avaliados, para que possam ser transformados com responsabilidade e planejamento.
Essa abordagem não se sustenta em ações pontuais ou individuais, mas exige uma intervenção feita por muitos. O enfrentamento dos riscos psicossociais deve convocar o olhar interdisciplinar: o psicólogo, o técnico e o engenheiro de segurança, o ergonomista, os líderes, os gestores de RH, os próprios trabalhadores. É um trabalho coletivo, que exige escuta, articulação de saberes e corresponsabilidade na construção de ambientes de trabalho mais saudáveis.
Nesse cenário, a Psicologia tem muito a contribuir. Embora muitas vezes associada apenas à escuta individual, à clínica tradicional, a Psicologia é, essencialmente, uma ciência que compreende o sujeito em relação com seu mundo. Como disse Sigmund Freud, “toda psicologia é social”, ou seja, há uma indissociabilidade entre sujeito e organização. O trabalhador não é uma ilha: ele vive, sente e adoece dentro de um contexto organizacional que estrutura e atravessa sua experiência.
A própria NR-1 é clara ao afirmar que a gestão dos riscos psicossociais deve ter foco na organização – e não no indivíduo isolado. É aí que a Psicologia se mostra necessária e tecnicamente habilitada. Com arcabouço teórico e metodológico consolidado, pode analisar os processos de trabalho, as dinâmicas de poder, os modos de gestão, os impactos subjetivos da cultura organizacional e colaborar na construção de estratégias de intervenção.
Ao invés de temer essa nova demanda normativa, é hora de reconhecê-la como uma oportunidade de amadurecimento institucional, onde saúde, produtividade e ética se somam. Com responsabilidade, escuta e compromisso coletivo, é possível fazer da gestão de riscos psicossociais uma potência transformadora dentro das organizações.
Autora: Marina Silveira