Tem algo nesse imperativo contemporâneo do cuidado com a saúde mental que me traz questionamentos. Não porque cuidar não seja importante, claro que é, mas porque o jeito como isso tem sido exigido de nós parece mais uma nova forma de controle do que um convite real ao cuidado de si. A gente vê, cada vez mais, um empuxo silencioso, quase sedutor, para que sejamos emocionalmente estáveis, resilientes, regulados, produtivos. A saúde mental virou pré-requisito de alta performance. E isso, paradoxalmente, adoece.
É como se o cuidado que nos vendem viesse já formatado para nos tornar corpos mais funcionais: dóceis, bem adaptados, eficientes. (Coisa que Michael Foucault já tinha falado faz tempo!) E a gente compra essa ideia, muitas vezes sem perceber. Vai se esforçando para dar conta de tudo, meditando no intervalo do almoço, respirando fundo entre uma tarefa e outra, praticando gratidão no meio do burnout. Tudo isso em nome de continuar sendo um bom recurso humano, disponível, confiável, emocionalmente equilibrado.
E é aí que entra um conceito poderoso, formulado por José Henrique de Faria: o sequestro da subjetividade. A subjetividade, que deveria ser o território do que é singular, imprevisível, nosso, vai sendo capturada por essa lógica do desempenho. A gente vai abrindo mão de partes nossas em nome de uma promessa de equilíbrio, de sucesso, de bem-estar, que, no fundo, tem mais a ver com o funcionamento do sistema do que com o nosso desejo.
Cuidar da saúde mental, sim. Mas não para seguir performando até a exaustão. Cuidar como quem resgata. Como quem resiste. Como quem reapropria de si aquilo que o mundo tentou sequestrar.
Autora: Marina Silveira